Hora das trindades… Cai a noite.
Na ponte, gigante de pedra descansando sobre as margens as suas pernas bambas, uma neblina se ergue das hortas até ao cruzeiro da capela.
A lua nova, rompendo a névoa, com as duas hastes voltadas para o céu… a marca da Deusa-Mãe, ilumina a fronte do Cristo na pedra…
Então, um clamor de fogaréus em danças orgíacas apodera-se da ponte e as águas do Cesarão redemoinham nos Pegões, incendiando-se em convulsivas labaredas.
Os demónios da floresta, acordados pelo clarão dos fogos, levantam-se em transe, e juntam-se à festa tocando pandeiros, fazendo libações com vinho novo, e depois, vão em procissão pelas margens, esconjurando as sombras.
E todos os espectros que se arrastaram pela ponte há dois milénios, ouvindo a música funérea dos pandeiros, emergem das águas em sangue e riem-se…. Riem da hora das trindades, da cruz, do Crucificado… é o riso da eternidade escarnecendo do presente, o bico da foice do druida abrindo o lado do Crucificado… o riso de Satã, na chaga de Cristo, a escorrer água e sangue…
Seguem-se pela madrugada as horas de Satã, as horas dos mortos… é Satã que agora vai a rir e a dançar, à frente desta tragicomédia, enquanto no céu brilhar a estrela Sirius.
É a sombra de Caim e não da cruz, que se projecta sobre a noite… uma sombra molhada em sangue.