É pacífico que uma das vertentes para o desenvolvimento integrado da economia do concelho, é a recuperação e divulgação do seu património, como alavanca do sector terciário e complemento do sector primário.
Mas recuperação do património, quer dizer, antes de mais preservação. E preservação é manter com respeito das suas características sem o desvirtuar com inovações que o descaracterizem.
Com o património é preciso o mesmo cuidado que uma operação plástica: se a intervenção desvirtua os traços essenciais do rosto, já não temos o mesmo rosto, mas outro, apesar da pessoa ser a mesma. Dá-se uma modificação da identidade física.
Por isso é que as intervenções sobre o património, e aqui refiro-me em concreto ao edificado, devem obedecer a critério do bom senso, e serem o mais conservadoras que possível, para evitar a sua descaracterização.
Ora, é precisamente o que não se tem verificado em algumas situações, de que apenas destaco as obras da Praça da República, que sendo uma boa iniciativa de homenagem a Manuel António Pina, são um desses exemplos de infeliz concretização do mau senso estético:
A intervenção na área do chafariz da Praça da República, com empedramento totalmente desenquadrado do resto da Praça, é um exemplo de falta de bom senso estético.
Agora acrescentaram-se uns bancos em madeira marítima para os munícipes gozarem a sombra dos medronheiros. Já nem é falta de bom seno; é ridículo!
De facto, o total calcetamento da zona do chafariz em pedra diferente, não o adequa ao resto da Praça também empedrada em toda a sua extensão, a qual, por não ter qualquer zona verde, resulta, pela solução dos medronheiros, arbustos de pequeno porte e copa baixa, demasiado aberta, e por isso esteticamente monótona.
Este resultado das obras podia mitigar-se reduzindo o empedramento agora colocado na área do chafariz, substituindo-o, mesmo que seja numa pequeníssima área, por jardim, e colocando no lugar dos medronheiros, árvores que pelo menos proporcionassem sombra e um recanto verde aprazível, realçado do resto da Praça.
É por sua vez conhecida a sensibilidade ecológica de Manuel António Pina e mais reservadas e conhecidas de alguns amigos, as suas ideias filosóficas iniciáticas e simbólicas, que se tivessem sido tidos em conta, proporcionariam elementos interessantes que podiam ter sido utilizados na execução da obra.
Os custos nem seriam muitos, dignificava-se a praça, homenageava-se mais condignamente o Manuel António Pina de acordo com a sua personalidade.
E o que não é de todo displicente, ainda vai a tempo de ser feito com pouco trabalho e custo, pelos serviços camarários!
Perguntarão os queridos leitores, que sabe este “escriba” de arquitectura paisagística, para “meter a foice em seara alheia”. Nada…
… mas sobra-lhe algum bom senso e bom gosto, que é o que tem faltado na recuperação do património concelhio!