Recentemente li um artigo num "media" local que dizia: «Nunca tanto se falou neste Concelho, como agora, da sua História, dos seus Homens e Mulheres de cultura, arte e política, das suas tradições, usos e costumes» e que «os habitantes do Concelho [...], juntamente com a Diáspora Concelhia, sentem uma nostalgia e uma melancolia em relação ao passado, em relação à maneira como viveram a sua infância, a sua juventude, e a tudo o que os rodeou». Isto «São actos de resistência feitos por resistentes, que sabem que uma modernidade equilibrada, sustentável e verdadeiramente Concelhia, nasce de uma reinterpretação da tradição» (António Emídio in "Capeia Arraiana")
É verdade que a história, a cultura, tradições, usos e costumes, são importantes para a caracterização de um povo. Como dizia Pascoais, é a caracterização das instituições, da alma de um povo, que permite escolher o futuro adequado a esse povo.
Também é importante o estudo do passado, para potenciar o presente. Como dizia Poincaré, um povo quando quer ganhar forças, vai buscá-las ao seu passado.
Mas o passado, apenas pode ser objecto da lembrança. Quando a lembrança é má, o passado esquece-se; quando agradável, pode causar um sentimento de nostalgia e melancolia, que é o desejo desse passado distante e a tristeza por não se poder revivê-lo. Duarte Nunes de Leão, D. Duarte, Garrett e Pascoais, chamaram a este duplo sentimento de Saudade!
Uma sociedade é como uma árvore, que para se renovar todas as Primaveras vai beber o húmus da terra, através das raízes. A história e a cultura, são o húmus de uma sociedade.
Uma árvore, se não for buscar o húmus à terra, se os ramos mais distantes, por qualquer motivo não forem buscar esse alimento às raízes, ela acaba por morrer. De que servem as raízes e o húmus, se os ramos não se renovam todas as Primaveras?
O mesmo se passa numa sociedade: O estudo do passado e da cultura, além de mera lembrança, tem de se converter num desejo de repetição no presente, ser uma esperança do presente e antecipação do futuro. Mas se ele não provoca o desejo de projecção no presente, ele não é mais que saudade, recordação melancolia, simples nostalgia, tristeza.
A Melancolia/Nostalgia, porque vive exclusivamente do passado, não cria esperança, não projecta o passado no presente, não antecipa o futuro, não é nada!
O tronco, os ramos, as folhas, os frutos de uma árvore, “sentem” a necessidade da seiva para sobreviverem e se renovarem ciclicamente. No estado botânico esta necessidade é o “stress hídrico”, que faz os frutos os ramos e o tronco irem buscar o húmus à terra.
Numa sociedade, o estado equivalente ao “stress hídrico”, que faz com que a Melancolia/Nostalgia se transforme em esperança no futuro, é a Angústia; uma disposição que a impele a questionar permanentemente as possibilidades de realização, numa acção sobre o seu destino e o tempo futuro. A este sentimento de Angústia, também assim designado por Heidegger, chamou Kierkegaard “Náusea”:
«Enterra-se um dedo no solo para cheirar em que terra se está; eu enterro o dedo na existência – ela não cheira a coisa nenhuma. Onde é que eu estou? Que significa dizer: Mundo?» Kierkegaard in Repetição III pág. 261
Por isso, não sendo nada, por si só, a Melancolia/Nostalgia, quando origina a perplexidade da Angústia, transforma-se numa energia positiva, porque as perguntas que formula sobre existência, exigem a procura de respostas, possibilidades, caminhos para a vida.
Quando ela fica no passado, a Melancolia/Nostalgia é um vazio do ser, que leva ao sentimento de Tédio, essa energia negativa que é um não fazer nada, em que a existência não tem sabor, nem sal, nem sentido.
No Tédio não há possibilidades e as que se dispõem estão mortas.
A Melancolia/Nostalgia, por si só, como elementos da Saudade, dizem respeito ao passado. E no passado não vão buscar-se energias. As energias estão no presente. Na forma como este interroga ou não o futuro e responde ou não às suas possibilidades, consoante a vida em sociedade é uma permanente Angústia, ou Tédio.
Como dizia Herculano: «Que são estas coisas de regeneração das tradições, senão sons ocos, que não correspondem a nenhuma ideia?» (Opúculos , III, pp 111-112).
Serve alguma coisa falar na História, nos Homens e Mulheres de cultura, arte e política, das suas tradições, usos e costumes, num concelho pobre, numa sociedade entediada?
È o desenvolvimento material da generalidade da população que trás o das virtudes espirituais e democráticas.
Como dizia António Sérgio: «os alicerces da democracia política são abertos na economia» (Regeneração e Tradição, Moral e Economia, Carta a Pascoais publicada na Àguia, Vol. V, 2.º série, 1914, pp 1-9)
Só a Nostalgia/Melancolia e o estudo da História, dos costumes, tradição e política, não chegam…
´ Também é preciso o Pragmatismo de saber agir sobre o presente, escolhendo o caminho e o sentido deste em relação ao futuro!
Para que serve uma árvore, se nem sombra dá?
Para que servem a História, os costumes, a tradição e a política, se não se traduzem em progresso material e espiritual?
Enfim…
De que serve uma coisa, se não tem qualquer utilidade?