O saudoso padre António presidindo a uma romagem na Ruvina, Sabugal
Ovídeo, um poeta latino do séc I d.c, escreveu uma obra chamada Fasti (Feriados), que os latinistas do meu tempo estudavam para perceberem o calendário romano, as suas bases astrológicas e sistema.
Quando aborda o mês de Fevereiro, que tem origem etimológica na palavra Februa, que designava o grão torrado e sal utilizado na purificação das casas, Ovídeo menciona um grande festival religioso, que vem também referido em Shakespeare, chamado as Lupercais ( de Lupus, lobo), que homenageava os primórdios de Roma e a gruta onde a Loba amamentara Rómulo e Remo.
Tal festival realizava-se entre o terceiro e sexto dias após os idos de Fevereiro (18 e 21) e servia para os romanos homenagearem os seus mortos. No último dia, os Parentálias ( de parens parentis, antepassados) levavam-se pequenas oferendas aos túmulos dos antepassados, em comemoração das oferendas de Eneias ao pai, Anquises, que morreu durante a viagem de Tróia para Itália.
Pois é bem possível que seja daqui que vêm as romagens aos cemitérios no dia de todoso-os-santos; um ritual que vem desde tempos imemoriais, sem que tenhamos a noção disso.
Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova
E depois o princípio de morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido…
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia…
Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente.
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste;
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.
Álvaro de Campos