Terça-feira, 10 de Novembro de 2009

 

 Foto de Lobo Duarte

 

Hoje o post é sobre o José Lobo Duarte, um amigo pintor e poeta de Coimbra, ainda pouco conhecido, e do qual tive a honra de apresentar o primeiro livro na RTP2. É possivelmente um dos maiores poetas surrealistas portugueses, a par de Cesaryny, e vai editar novo livro, longe das parangonas dos media, a que é avesso. Aqui ficam dois textos (revistos por mim) do poeta; deliciem-se, porque a posteridade vai falar dele:

 

I - Tenho um pensamento.

Tenho um pensamento; e não tenho coisa alguma, que não seja ouvir, esquecer; e ainda essa tua musica! Eu sei lá onde começa a eternidade! São as palavras que limitam; não os teus braços… O teu corpo…

  O grito caiu-te nas mãos? Também nas minhas, como gotas de água. Tenho um pensamento; mas és tu que me guias, que tens os olhos tristes e os lábios doces; e é daí a poesia pura, mas basta a natureza e o instinto dos homens para, que isto e o mais, se acrescente á definição de poesia.

 Tenho um pensamento; e é assim uma despedida; mas a musica não deixa que vá; e mais forte ainda é a esperança dos homens. Se eu partir, como poderei ver a esperança dos homens, assim sentida, na perspectiva física, na dúvida que há com a morte e com a fé?

Tenho um pensamento e não tenho, porque sou um pássaro que voa; um momento que escapa. Morremos quando todos os momentos voam do nosso corpo para a paixão e regressam ao momento original, em que não será falsa a pronúncia do amor.

Tenho um pensamento e não tenho; este absurdo, mata-me! Falam-me da guerra e do rapaz nu com uma flor, que afinal não era.

 

A menina do terceiro andar, que anda na catequese, disse que era um pénis…

 

Era o milagre do pénis!

 

Que trazes nesse regaço?

 

São flores senhor…

 

Flores!?  Mas que espanto esse,

que vejo no teu corpo!

 

A menina do terceiro, era afinal, e este era o assunto, um menino com pénis, localizado naquele ponto.

 

Tenho um pensamento e não tenho; e isso me diverte e repugna.

 

São pénis, senhor…

 

E toda esta afirmação, com reticencias para o milagre da vida, que é esta saliência. Nasceu disto esta nação; e afinal é o cu, a aparência da portuguesa condição.

 

Tenho um pensamento, uma folha de trinta e cinco linhas e uma corda...

 

Amanhã a vida anda á roda!

 

 

 

II- A água que posso imaginar, na ideia do desejo que tenho de ti.

  

Atravesso o rio, as paredes de água e a sede do teu corpo, a tua cidade onde da janela me chamas; e o meu pensamento anda sempre em viagem; e os pássaros levam em viagem, a minha vontade de ir a outros lugares.

Estou mais a teu lado, quando me afasto da tua presença e trago de volta o paraíso ao teu corpo. Atravesso a água e bebo toda a água que posso imaginar, na ideia do desejo, que tenho de ti.

O meu pensamento anda sempre em viagem. Canto as canções que não me pertencem; e tu entras nessas canções e nas paisagens, que ficam dentro de mim, quando fecho os olhos e as faço desaparecer.

 A tua cidade chama-me; e também tu, quando o fazes e me continuas a iluminar!

 

                                                         José Lobo Duarte

 



publicado por Manuel Maria às 16:08 | link do post | comentar

1 comentário:
De ana a 30 de Novembro de 2009 às 15:54
Já deixa uma vontade de ler mais do autor.
É sempre marcante a viagem que se faz a este lugar de sentir e dizer.


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