A ponte é apenas
prostituta
Da oca ideia de ti,
Mas tu
Já não te mostras assim,
Tu és pedaço de sombra
e silêncio adivinhado
Num cimbalino a escaldar.
Tu és
Todos os bairros e ilhas,
A Foz e o Campo Alegre,
O Palácio e a Rotunda,
Todos os mártires da pátria,
O Infante, as Fontaínhas,
Sá da Bandeira, Bonfim,
Antas, Maia e Rio Tinto,
Gondomar e Matosinhos,
ou Vila Nova de Gaia.
Tu és mais meu ao nascer,
Serás mais meu ao morrer.
Mas afogado no Douro,
Agricultando-te esquinas,
Arando a pedra e a sombra,
Cultivando-te o mistério,
Vim da Ribeira para cima,
Perdendo o ar em Mouzinho,
E encostei-me às Cardosas
Para te olhar o focinho,
O tal salão de visitas,
Que os Aliados cederam
Ao Universo.
Ficas-me imerso
Na carne,
Ficas perverso
No sangue,
Fervendo o sal do sotaque,
Fazes doer a distância
Quando me afasto de ti,
E fico longe do verso,
Então, descolo do chão,
Embriago-me em calão,
Palavras largas, ovais,
E em Rabelo, a saudade
Vem ao poema lembrar
Que um “carago” dito assim,
Na ausência da cidade,
Põe um tripeiro a chorar.
Amamos a insultar.
Por isso, não há cicuta
Nem desvio de conduta,
Quando os comboios apitam
E em Campanhã te gritam
“Meu Porto filho da puta!”
Pedro Guilherme-Moreira "in Portolegal"