Quarta-feira, 18 de Junho de 2008

 

 

  

            A companhia saiu em manobras. Uma coluna de viaturas comandada pelo capitão, com um tenente, um aspirante miliciano quatro sargentos e cinquenta praças distribuídos por duas secções de atiradores.

             A meio do percurso uma das viaturas avaria. A coluna detém-se.

            -Averigúe porque parou a coluna, nosso tenente – ordena o capitão.

            -Nosso aspirante, veja o que se passa – ordena por sua vez o tenente.

            -Que aconteceu, nosso sargento? – indaga o aspirante.

            -Porque parou esta merda, nosso cabo? – pergunta o sargento.

            -Que merda foi esta, pá? - Quer saber o cabo.

            -Os caralhos da oficina não viram o óleo, nosso cabo - explica o condutor.

            -Falta d’oleo, meu sargento…- informa o cabo.

            - Gripou, meu aspirante – reporta o sargento.

            -O motor não trabalha, meu tenente – traduz o aspirante.

            -A viatura parou, meu capitão – resume o tenente.

            -Ora, Cardoso – impacienta-se o capitão -  que parou vi eu. Parou porquê?

            -Ó Martins – volta o tenente ao aspirante-  parou porquê?

            -Sei lá!…Tenho ar de mecânico?

            -Manobras suspensas – ordena, irritado, o capitão - todos de volta ao quartel!

            -E a viatura empanada, meu capitão? – preocupa-se o sargento.

            -Aguarda rendição, pá!

            -Afirmativo!

             E a coluna regressou, para gozo do quartel, sem disparar um único tiro, vencida e com duas baixas: O cabo Franklin e o soldado Gomes, perdidos algures, numa estrada da serra.

 

 

      



publicado por Manuel Maria às 12:07 | link do post | comentar | ver comentários (3)

Segunda-feira, 16 de Junho de 2008

 

 

Ao fundo, no primeiro andar do edif. cor de tijolo, o meu quarto no quartel dos Lóios.

            

            O edifício cor de tijolo, ao chegar ao largo, metade em altura de três andares, a outra metade um muro corrido rematado de ameias e telhado de uma só água a cair para dentro, tudo guardado por um enorme portão verde, encimado pelo mastro da bandeira, descascado pelo sol.

            Transpondo o portão, a casa-da-guarda, à direita de quem entra; uma pequena caserna, com dois respiradouros à altura de um homem e meia dúzia de catres.

            Espreita o graduado de dia ao sol cinzento impessoal da parada, o pijama a sair-lhe do traje de brim, meio ensonado:

            -Bom dia senhor doutor - e bate a continência.

            É "maçarico". Qualquer dia já nem me liga. Subo a rampa. O cabo “polainas” com um praça preparam-se para içar a bandeira. Enche os pulmões, sopra no clarim a cantilena que sei de cor:

            Taa ta tataa… taa ta tataa…  taa ta tataaaa…

            Dezenas de homens sem cérebro, sem cabelo, rapados por igual à navalha do barbeiro, saem da caserna e sobem à parada formando em três filas, virados para o edifício de comando, costas voltadas para o rio.

            A sombra azul dos plátanos alinhados ao longo do mirante, projecta-se na calçada. As transparências do céu caem no rio com os barcos atracados no cais da marinha. Nenhum movimento no rio ainda àquela hora da manhã.

            Alinham-se as filas. Espera o sargento. À frente o corneta, depois os reforços à porta e por último os faxinas. Tudo a postos para a chamada.

            1,2… 1,2… Unir fileiras. Esquerda… Esquerda… Sobe até à formatura no picadeiro a sombra em diagonal dos plátanos, atenção… em frente sentido! 14… Pronto! 125… Pronto! 18… De guarda a S. Bento… 27… baixou à enfermaria! E prossegue a chamada.  

            Berra o clarim c’o fumo cinzento a subir da cozinha, o sol nos metais amarelos das fardas. Capitão Sá ordena o destroçar. 1, 2… Esquerda volver, marche!

            E a sombra desfaz-se pró sol de brim salpicar as janelas e me ferir nos olhos.

            Espreita o Rebolo à esquina da sala dos oficiais.

            - Despacha-te. Já estamos à espera!

            Atravesso a parada em direcção à messe. Passámos todo sábado a jogar King, com intervalo para almoço e jantar. Estavamos na flor da juventude. Era o tempo feliz em que não tínhamos outras preocupações na vida.                      



publicado por Manuel Maria às 15:29 | link do post | comentar | ver comentários (3)

Sexta-feira, 13 de Junho de 2008

 

 

 

 

Botei sorte

Para você

E os astros dizem

Que você é linda de morrer,

Mas isso a gente sabe,

Não precisam astros dizer,

Não precisava a gente

Botar à sorte.

 

Baralhei,

Lancei de novo,

E os astros dizem

Que você,

Vai pintar muita luz

Em suas asas

E voando, irá,

Incendiar as flores.

Depois,

Tudo que você tocar

Pegará fogo.

Depois,

Esse fogo

Virará centelha

De amor.

 

E tudo o que você beijar

Nesse seu voo errático

Será melhor.

 

Assim

Ditaram as cartas.

 

Assim

Falaram os astros

. 



publicado por Manuel Maria às 21:01 | link do post | comentar | ver comentários (1)

Segunda-feira, 2 de Junho de 2008

 

 

 

     História para adormecer o netinho, quando se reformar depois de perder eleições de 2009:

 

Era uma vez,

um pobre homem

que vivia num humilde casebre

rodeado de uma pequena granja,

com a mulher, um filho de tenra idade

e duas vacas

desengonçadas

e magras.

 

Sustentavam-se do que a granja dava,

o que nos dias magros

pouco mais era que queijo

do leite das vacas.

 

Por isso

Aquilo de que o homem

mais gostava na vida, 

era de queijo.

 

Tinha a dispensa cheia de queijo,

guardava queijo debaixo da cama,

sonhava com queijo,

respirava queijo,

comia queijo ao pequeno-almoço,

ao almoço

e ao jantar!

 

E claro, depressa chegaram ao casebre

todos os ratos da granja

dispostos a comê-lo

também.

 

Um dia,

o homem,

encontrou um desses animaizinhos

dentro do queijo

que estava a comer.

 

Zangado,

chamou a mulher

para que o ajudasse a livrar-se

de todos aqueles ratos.

 

Sentados à mesa

estiveram todo o dia e toda a noite

a pensar… A pensar…

até que encontraram uma solução:

 

Encher o casebre de gatos!

 

Dito e feito.

trouxeram tantos gatos

que os ratos, quando os viram,

pernas para que vos quero,

fugiram para a cochinchina.

 

O homem ficou muito contente,

Mas a sua alegria não durou muito:

os gatos sentiram-se tão bem no casebre

que não se queriam, ir embora.

 

Não paravam de correr para cima e para baixo

e até arranharam os chinelos favoritos do homem.

 

Então, o homem pediu

à mulher

que descobrisse uma forma

de se livrarem deles.

 

 

Desesperados,

Sentaram-se todo o dia e toda a noite

a pensar…. A pensar…

Até que encontraram a solução:

Encher o casebre de cães!

 

Dito e feito.

Trouxeram tantos cães

que os gatos, quando os viram,

pernas para que vos quero,

fugiram para a cochinchina.

 

O um homem estava muito contente,

mas a sua alegria durou pouco:

os cães sentiram-se tão bem no seu casebre

que já não queriam sair.

 

Passavam o dia

a ladrar aos vizinhos, e pior:

faziam xixi e cocó

por todos os cantos!

 

O homem que nunca tal coisa vira;

Pediu à mulher

que encontrasse

uma maneira de se livrarem

de todos aqueles cães.

 

 

Desesperados,

Sentaram-se todo o dia e toda a noite

a pensar…. A pensar…

Até que encontraram a solução:

 

Encher o casebre de leões!

 

Dito e feito.

Trouxeram tantos leões

que os cães, quando os viram,

pernas para que vos quero,

fugiram para a cochinchina.

 

 

O homem

Sentia-se importante, rodeado de feras,

Mas a sua satisfação pouco durou:

Os leões eram tão ferozes que os vizinhos faziam xixi de medo

Só de os ouvir rugir!

 

Mais uma vez, o homem pediu ajuda à mulher que o livrasse dos leões.

 

Desesperados,

Sentaram-se todo o dia e toda a noite

a pensar…. A pensar…

Até que encontraram a solução:

 

Encher o casebre de elefantes!

 

Dito e feito.

Trouxeram tantos elefantes

que os leões, quando os viram,

pernas para que vos quero,

fugiram para a cochinchina.

 

Desta vez, a alegria do homem durou pouco:

os elefantes eram tão gordos

que dentro do casebre

não cabia uma agulha!

 

Rapidamente pediu à mulher ajuda

Para se livrar de todos aqueles elefantes.

 

 

 

Desesperados,

Sentaram-se todo o dia e toda a noite

a pensar…. A pensar…

Até que o filho lhes disse

aquilo que toda as crianças sabem:

 

-Os elefantes têm muito medo de ratos!

 

Como naquele casebre

Eram todos

Um tanto ou quanto

Lentos de compreensão,

mandaram vir outra vez os ratos.

 

Mas os ratos voltaram a comer o queijo;

e para expulsar os ratos, tiveram que trazer os gatos;

e para expulsar os gatos, trazer os cães;

e para expulsar os cães, trazer os leões;

e para expulsar os leões, trazer os elefantes;

e para expulsar os elefantes, trazer os ratos…

 

E assim,

Sem nunca mais acabar!

 

 

(Adaptação a uma adaptação de Joan de Boer a um conto tradicional árabe)

 

 

 



publicado por Manuel Maria às 13:30 | link do post | comentar | ver comentários (1)

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