«Respondeu Nausicaa de níveos braços (a Ulisses que naufragara nas praias da sua pátria): Estrangeiro, visto que me pareceres ser mau nem insensato (…) já que vieste à nossa cidade e a esta terra, não terás falta de roupa nem de nenhuma coisa das que necessita um pobre desgraçada que vem ao nosso encontro. Quero indicar-te a cidade e dizer-te o nome destas gentes.»
E a jovem recorda às servas assustadas com o estrangeiro:
«Fugis à vista de um homem? Julgais, porventura, que é algum inimigo? (…) Este que chegou aqui é um infeliz que anda errante. Nós devemos cuidar dele, porquanto São de Zeus todos os estrangeiros e indigentes; e o bem que se lhe faz, por pequeno que seja, é precioso. Dai-lhe, pois, de comer e de beber; e em seguida levai-o, num lugar abrigado do vento.»
(Odisseia, VI, 187 e ss)
“Não posso existir sem o outro, que o não será plenamente se em tudo me for idêntico”.
(Eduardo Lourenço)
«Não me chames estrangeiro
Não me chames estrangeiro, só porque nasci longe
Ou porque tem outro nome essa terra donde venho.
Não me chames estrangeiro porque foi diferente o seio
Ou porque ouvi na infância outros contos noutras línguas.
Não me chames estrangeiro se no amor de uma mãe
Tivemos a mesma luz nesse canto e nesse beijo
Com que nos sonham iguais nossas mães contra o seu peito.
Não me chames estrangeiro, nem perguntes donde venho;
È melhor saber onde vamos e onde nos leva o tempo.
Não me chames estrangeiro, porque o teu pão e o teu fogo
Me acalmam a fome e o frio e me convida o teu tecto.
Não me chames estrangeiro; teu trigo é como o meu trigo,
Tua mão como a minha, o teu fogo como o meu fogo,
E a fome nunca avisa; vive a mudar de dono. (...)
Não me chames estrangeiro; olha-me nos olhos
Muito para lá do ódio, do egoísmo e do medo,
E verás que sou homem, não posso ser estrangeiro.»
(Rafael Amador – poeta e cantor Argentino)